Camões e a consciência nacional

Na estimativa dos portugueses, Os Lusíadas constituem a Bíblia nacional, e este juízo é corroborado por numerosos estrangeiros, como por exemplo Cervantes, que apelidou o poema de Tesoro del luso, e Hegel, que o reputou inteiramente nacional.

Pode discutir-se se a conceção da história portuguesa como valor épico é original de Camões, ou se o poeta foi apenas o realizador estético de uma ideia e aspiração que lhe era anterior. Os factos parecem inculcar esta última opinião; mas, seja qual for a resolução final do debate, sempre ficará líquido que a inspiração camoniana brotou do ambiente e da história nacional. Por isso Camões não é a réplica portuguesa de Virgílio, Ariosto e Tasso, e para o provar, por outra via, abundam as investigações sobre as fontes do poema, concordes em nos apresentarem Camões meticuloso na exatidão dos factos, quer os colhesse nos livros, em grande maioria portugueses, quer na experiência pessoal, do que viu, observou e padeceu.

Se o assunto e as fontes prendem objetivamente Os Lusíadas à história pátria, força é reconhecer que a composição do poema obedece ao primado da vontade, que não da inteligência como centro convergente.

Camões não se deteve em análises psicológicas, não transmitiu dúvidas nem lutas interiores, nem se extasiou na modelação de visões escultóricas; admirou e exaltou a vontade inquebrantável e tenaz na medida em que ela realiza aspirações coletivas e se coloca ao serviço de fins nacionais.

Realmente Os Lusíadas são um poema de ação e da vontade, de empresas e realizações coletivas, em que o herói, sua incarnação, é um momento na sequência dos acontecimentos. Daí a unidade do poema, cujo centro são os feitos dos portugueses.

Se a raiz do poema mergulha na história nacional, se o desenrolar da sua ação tensa se desenvolveu no plano da vontade ao serviço de fins coletivos, compreende-se que a confiança nos destinos de Portugal seja o valor ético que desperta.               

Com efeito, assim é: todas as gerações encontram n'Os Lusíadas, nas horas difíceis e incertas da Nacionalidade, alento, confiança, certeza, como em 1640 e em 1810. Ë que Camões legou-nos um modo de compreender e sentir a Nacionalidade de valor constante e objetivo, porque assenta na rocha dos factos e nos sentimentos profundos da alma portuguesa.               


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