9. Ricardo Jorge na historiografia cultural portuguesa

Daqui a necessidade de um balanço equitativo e desapaixonado das nossas atividades culturais com o pensamento forasteiro, principalmente peninsular, para o qual concorreu com valiosos contributos, designadamente em páginas do ensaio biográfico e crítico acerca de “Francisco Rodrigues Lobo”, nos “Comentos à vida, obra e época de Amato Lusitano” e no discurso exortativo “A intercultura de Portugal e Espanha no passado e no futuro”.

A sua noção de intercultura, que parece ter-se apoiado na conceção unitária de Menéndez y Pelayo, tem, sem dúvida, fundamentação real, mas está impregnada de um sentido valorativo eminentemente pessoal. Os factos que indagou, mormente no que respeita à influência da Universidade de Salamanca e sobre os quais construiu os juízos gerais, persistem como materiais definitivos; os juízos, porém, pelo que contêm ou implicam de generalização e de apreciação valorativa, testemunham, sem dúvida, o talento de Ricardo Jorge, mas são intrinsecamente verosímeis, como o são, aliás, todos os juízos históricos, que jamais podem alcançar a exatidão e o rigor dos juízos científicos. Uma reconstrução e valoração histórica nunca pode considerar-se definitiva e acabada, porque a história é uma reconstituição em permanente revisão e os juízos com que ela se constrói são intrinsecamente correlações dependentes de múltiplas circunstâncias, desde o volume e densidade dos factos considerados à consciência intelectual e à capacidade imaginativa do historiador. Isto não quer dizer que os juízos histórico-valorativos de Ricardo Jorge sejam circunstanciais e hajam perdido atualidade. Não. Coerentes com o estado dos conhecimentos no seu tempo e com o sentido de positividade que lhe nutriu a mente — e nisto reside o fundamento da verosimilhança que possuem — eles são atuais, pelo menos como ponto de partida ou de contraprova, tanto mais que alguns incidem sobre temas que não foram retomados. 

Figueira da Foz, Páscoa de 1958


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