3. Correntes ideológicas. Henriques Nogueira. Socialismo, federalismo e unitarismo

V. Queremos o sufrágio universal para todos os membros da Federação Portuguesa, tanto do sexo masculino como do sexo feminino, que tiverem completado 18 anos.

VI. Queremos a inviolabilidade absoluta do domicílio e da correspondência.

VII. Queremos a abstenção completa da lei em matéria de casamento, considerando este como um simples contrato entre o homem e a mulher, contrato livremente consentido, ficando à lei apenas a vigilância para obrigar os contratantes ao cumprimento das condições a que se houverem sujeitado.

VIII. Queremos que a cada um assista o direito de resistir às autoridades, todas as vezes que estas, no exercício das suas funções, praticarem abusos; e que qualquer cidadão tenha o direito de chamar perante os tribunais os funcionários ou funcionário público por crime de que os considerar culpados.

IX. Queremos para todos os cidadãos que tenham completado 18 anos e estejam no gozo dos seus direitos civis e políticos, o direito de serem eleitos e tomarem parte em cargos públicos da Federação, estados, províncias, municípios e paróquias da mesma; e para os quais cargos não seja necessária uma capacidade científica especial, designada pelas leis.

X. Queremos a abolição da prisão preventiva para todos os supostos criminosos, excepto no caso de manifesto flagrante delito de assassinato.

XI. Queremos a eleição de todas as autoridades populares, como juízes, escrivães de fazenda e judiciais, recebedores, tesoureiros, administradores, feita diretamente pelo povo.

XII. Queremos a eleição de uma câmara federal, na qual resida o poder soberano e central da Federação Portuguesa, eleita por sufrágio direto, cujos poderes durem dois anos e que tenha a seu cargo:

Estabelecer as relações diplomáticas com as nações estrangeiras;

Contrair alianças com essas nações e fazer tratados de comércio; superintender sobre os correios, telégrafos e caminhos-de-ferro, ficando às paróquias, municípios, províncias e estados o direito de servirem-se delas para fins oficiais;

Pagar os juros e amortizar a dívida pública; resolver os conflitos que surgirem entre os estados ou entre estes e a Federação;

Legislar sobre a unidade de pesos e medidas e moeda;

Superintender sobre o exército e marinha federal;

Organizar a defesa e fazer a paz;

Nomear, remunerar e regulamentar os empregados permanentes da Federação; Velar pela segurança interior e exterior da Federação;

Fazer as leis necessárias para fixar a competência dos tribunais em todos os Estados da Federação, sobre a base da justiça gratuita instituição do júri para todos os processos civis, criminais, e correcionais, júri eleito pelo povo, assim como os juízes.

Fixar a época das suas reuniões e duração legislativas.

XIII. Queremos que o governo central, ou conselho federal, seja eleito para esta câmara, podendo a eleição recair, sobre quaisquer cidadãos elegíveis, e devendo renovar-se cada sessão legislativa; não sendo assim o poder executivo mais do que uma comissão ou delegação do poder legislativo.

XIV. Queremos que cada um dos estados, províncias, municípios e paróquias, em que se dividir a Federação Portuguesa, tenha a sua câmara de eleição direta e o conselho do governo respetivo, eleito pela mesma câmara.

XV. Queremos o mandato imperativo para todos os deputados e a representação das minorias em todas as assembleias e corpos legislativos.

XVI. Queremos que todos os cargos provenientes da eleição sejam revogáveis por contra--votação de eleitores.

XVII. Assim como queremos a abolição da monarquia e do monarca, não queremos presidente da Federação, nem presidente do governo nem da câmara; elegendo estas, todas as vezes que se reunirem, por aclamação ou escrutínio, um qualquer dos seus membros para dirigir os trabalhos da sessão.

XVIII. Queremos a abolição de todos os impostos atuais e a sua substituição por um imposto único, proporcional, sobre a renda.

XIX. Queremos a separação completa da Igreja e do Estado, de modo que cada cidadão pague e siga o culto que a sua consciência lhe aconselhar, sendo completamente banido das escolas oficiais dos Estados o ensino de qualquer religião.

XX. Queremos a abolição do exército permanente que é uma fonte de esgoto de todas as forças vivas da nação, um foco permanente de desmoralização e um perigo constante para a liberdade.

XXI. Queremos a extinção da dívida pública, que absorve uma grandíssima parte dos rendimentos da nação, sustenta um parasitismo inútil, e torna impossíveis todos os melhoramentos.

XXII. Queremos a extinção do corpo diplomático, substituído por cônsules, e, onde for necessário, por simples encarregados de negócios; e a abolição do carácter de representação nas funções públicas, considerando o serviço do empregado público como qualquer outro trabalho, sujeito à norma comum dos salários.

XXIII. Por conseguinte queremos a extinção das jubilações, terços, reformas, aposentações e pensões aos empregados públicos ou suas famílias, visto que a lei do trabalho diz que se deve somente pagar àquele que o exerce.

XXIV. Queremos a desacumulação dos cargos públicos, de modo que não suceda, como hoje, exercer um indivíduo vários cargos, pelos quais percebe grossos ordenados, não trabalhando geralmente em mais de um.

XXV. Queremos a instrução oficial completamente gratuita nos seus três ramos: primário, secundário e superior, a fim de que o filho do povo, que não tem meios para pagar propinas e obter os elementos de ensino, possa também ter entrada nos estabelecimentos de ensino superior; e queremos a abolição dos graus, prémios e distinções académicas, para que todos se achem em igualdade de circunstâncias perante o público, único juiz capaz de apreciar imparcialmente e premiar o merecimento de cada um.

XXVI. Queremos a extinção dos subsídios aos teatros, carreiras de paquetes, a estabelecimentos de luxo científico e artístico, como o conservatório, academia das belas artes e real das ciências, curso superior de letras e outras semelhantes criações do estado monárquico, aristocrático e centralizador.

XXVII. Queremos que os estabelecimentos industriais do Estado, que são meras criações da centralização, como empresa nacional, fábrica de pólvora, dita de vidros da Marinha Grande, arsenais de marinha e do exército, cordoaria nacional, conventos, palácios e outros edifícios públicos; as matas nacionais, como o pinhal de Leiria e outras, sejam alienadas pelo Estado, deixando este de exercer qualquer função industrial.

XXVIII. Finalmente queremos uma legislação protetora do trabalho das mulheres e das crianças nas fábricas, fixando-se o número máximo de horas que umas e outras devem trabalhar e determinando-se a idade, antes da qual será proibido o trabalho das crianças.

Aprovado em segunda leitura pela assembleia geral do Centro Republicano Federal de Lisboa. Domingo, 22 de Junho de 1873.

                                                                                                                                                    O Secretário da sessão,

(a)    HORACIO FERRARI

 


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