V. Literatura romana de significação histórico-pedagógica

A leitura e a escrita constituíam o objeto do ciclo inicial. Recomenda que se aprenda a ler mediante letras de marfim, e, quando o menino já ensaia a leitura, que os textos concorram para a formação moral. Para a aprendizagem da escrita recomenda que o menino aprenda primeiramente a traçar as letras gravadas em tabuinhas, e depois se aplique a escrever frases em tabuinhas revestidas de cera. Os primeiros exercícios de composição deviam ser feitos oralmente e ter por base as fábulas de Esopo.

Quintiliano foi dos primeiros a ponderar as vantagens e inconvenientes do ensino público e do doméstico. O regime doméstico, isto é, o regime de um mestre para um só aluno, mão oferece as vantagens que à primeira vista apresenta; por isso, deu preferência ao ensino em comum, ou público, a cujo favor militam razões de ordem moral (camaradagem, sociabilidade, emulação, sentimento da responsabilidade) e intelectual (autoaprendizagem, ensino mais animado, escola imagem da vida). O mestre deve esforçar-se por conhecer a índole e a capacidade do educando, não lhe aplicando castigos corporais, por ser tratamento próprio de escravos.

No seu plano, a instrução propriamente dita desenvolve-se nos dois graus tradicionais: a Gramática e a Retórica.

O estudo da Gramática, cujo fim consiste em falar e escrever corretamente, sem se perder em minúcias e abstrações, devia iniciar-se depois do menino saber ler e escrever. Compreendia duas partes: a metódica e a histórica; aquela, consistia na aprendizagem do vocabulário e das regras gramaticais; esta, na compreensão cabal dos textos. A linguagem a ensinar devia ser a da gente culta, e não a do vulgo; e como para bem ler se torna necessário compreender o que se lê, entende que o estudo do vocabulário devia ser acompanhado das noções adequadas à respetiva compreensão e seguido de exercícios de recitação e de redação, tendo por modelo as fábulas de Esopo. Sendo fundamental, designadamente para a formação do juízo, pela apreensão da concordância da relação das palavras com as coisas que elas exprimem e com a perfeição de que são suscetíveis, Quintiliano entende, não obstante, ser conveniente que o aluno de Gramática aprenda simultaneamente Geometria, Música e Filosofia, pois a variedade das matérias concorrerá para o ilustrar e para lhe robustecer a atividade intelectual.

A explicação literária, recaindo sobre a forma e sobre o fundo, e os exercícios de recitação e de redação são assim associados, por forma que o futuro «orador» aprenda noções gerais de carácter enciclopédico e adquira atitudes distintas, próprias de quem usa da palavra.

À Gramática seguia-se o estudo da Retórica, ou Eloquência, cujo sistema, enquanto «ciência de falar bem», Quintiliano expôs nos Livros II-XI da Instituição oratória.

Sob o posto didático, cumpre atentar principalmente nas suas opiniões acerca das leituras e dos exercícios de redação e de declamação (declamationes).

O orador carece de amplos e variados conhecimentos, em especial de História, por ser um tesouro de exemplos, de Filosofia, assim teórica como prática ou ética, e de Direito, que prepara para a advocacia e, de modo geral, para a intervenção nas causas e assuntos da vida pública. Considerou, por isso, como leituras preferíveis os escritos de Cícero e de Tito Lívio e os livros de Filosofia e de Direito, os quais devem ser lidos nos originais e não nas seletas ou antologias, pois não é conveniente separar um texto do respetivo contexto.

No desenvolvimento do ideal expresso na máxima de que o orador deve ser «vir bonus, peritus dicendi», Quintiliano considerou a oratória uma «virtude». É que, a seu ver, após Catão-o-Velho e Cícero, e de acordo com as exigências da própria cultura romana, o perfeito orador tem de ser moralmente um indivíduo bem constituído, em cuja mente e conduta o falar e o atuar, o pensar e o viver coincidam. Do seu comportamento e apresentação deve desprender-se a impressão da dignidade e da seriedade, tanto mais que exercendo a eloquência grande poder de persuasão, o orador tem por dever empregá-la com finalidade moral.

O ideal do perfeito orador conjuga, assim, a correção e elegância do dizer, o saber, a justeza de pensamento, a largueza de vistas e a bondade e seriedade do carácter. Três condições e factores o preparam e formam: a natureza, entendendo por tal os dotes e capacidades nativas, físicas, intelectuais e morais; o ensino, que é adjuvante e complemento das disposições naturais; e o hábito, que se constitui pelo exercício.

A Instituição oratória não tem similar na literatura pedagógica romana; contém muitas e valiosas observações sobre os educandos e sobre a disciplina e os deveres dos mestres. A sua influência foi muito grande durante a Renascença, depois de Poggio haver descoberto (1416) o texto completo, do qual a Idade Média somente conhecera partes, tornando-se, por assim dizer, o livro-base da formação humanista.


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