Foi em Goa, em 1542, por iniciativa de São Francisco Xavier, que se criou a primeira escola destinada ao ensino dos filhos dos convertidos, seguindo-se-lhe pouco depois o Colégio de Messina, em 1548 e o Colégio Romano, em 1550, aberto a estudantes de todas as nações, instituídos um e outro pelo próprio fundador da Companhia, que aliás promoveu no curto lapso de seis anos a fundação de trinta e três externatos, entre os quais, em 1553, os Colégios de Santo Antão, em Lisboa e o do Espírito Santo, em Évora, que em 1559 foi erigido em Universidade, na qual se poderiam ensinar todas as disciplinas, com exceção da Medicina, do Direito Civil e da parte contenciosa do Direito Canónico. Em Coimbra, foi fundado em 1542 o Colégio de Jesus, reservado à formação de membros da ordem e de futuros missionários, sendo o primeiro que a Companhia instituiu com esta finalidade; em 1555, porém, o Colégio das Artes, que André de Gouveia organizara como escola de humanidades, foi mandado entregar à Companhia, com o que alcançou, praticamente, o monopólio do ensino preparatório ou secundário.
A partir de então, a atividade docente da Companhia de Jesus estendeu-se a todos os países católicos, principalmente nos centros universitários e nas regiões mais ameaçadas pela propaganda protestante, não, sem sofrer, aqui e além, resistências e oposições; não obstante, volvidos oitenta anos sobre a data do primeiro instituto não reservado somente aos futuros membros da Companhia, em 1626, contavam-se quatrocentos e quarenta e dois colégios, sitos nos mais variados territórios e latitudes.
A aplicação das diretivas fundamentais das Constituições às exigências da realidade docente deu ensejo a opiniões e práticas nem sempre uniformes, expressas designadamente nos regimentos dos diversos colégios, dos quais foi como que modelo a Ordo studiorum (1560-1570) do Colégio Romano, nas cartas ânuas dos reitores e nas instruções de provinciais. A Congregação Geral da Ordem, em 1581, manifestou o voto de que se estabelecesse a unidade de pensamento e de ação docente, para o que nomeou uma comissão da qual fez parte Pedro da Fonseca, o «Aristóteles Conimbricense». Coube, porém, ao geral Cláudio Acquaviva (1581-1615), eleito nesta congregação, a execução deste desiderato, que consistia, essencialmente, em recolher os resultados da experiência docente da Companhia e em os confrontar com as bases e diretivas da quarta parte das Constituições, em ordem à elaboração de um único regimento de estudos, válido para todos os colégios da Companhia. Consequentemente, nomeou uma comissão de seis padres jesuítas, de Espanha, Portugal, França, Áustria, Alemanha e Itália, a qual se reuniu em Roma e elaborou um parecer, tendo em consideração, dentre outros documentos, os regimentos e disposições em vigor nos colégios da Companhia e noutras escolas. Submetido à apreciação dos mestres do Colégio Romano, foi depois impresso, em 1586, e remetido a todas as províncias da Companhia para observarem o que tivessem por conveniente. Recolhidas as observações a este projeto, cujo texto constitui a primeira edição do Ratio studiorum e cujos exemplares foram apreendidos pela Inquisição de Valladolid, saíram posteriormente as revisões de 1591 e, de 1599, constituindo esta a edição definitiva do Ratio atque institutio studiorum societatis Iesu, cujas disposições, com ligeiras modificações determinadas pela congregação geral de 1605, foram universalmente aplicadas até à extinção da Companhia, em 1773. Após o restabelecimento da Companhia (1814), o plano de estudos do Ratio sofreu em 1832 alterações, principalmente no respeitante ao ensino das disciplinas científicas, sem aliás se afetarem a estrutura e a metodologia, que se mantiveram constante e rigidamente uniformes, ao contrário dos planos e métodos das escolas medievais e humanistas. É, pois, com base no Ratio studiorum de 1599 que cumpre estudar o que mais importa à organização, ao plano de estudo e ao método de ensino nos colégios da Companhia.
Na estrutura, o Ratio studiorum é um conjunto de preceitos, de regras e de determinações relativas à atividade pedagógica do provincial, no que toca aos estabelecimentos docentes da sua província, dos reitores dos colégios, dos prefeitos de estudo e dos mestres das diversas classes. É um código, e não um tratado de pedagogia. Deixando de lado a formação dos membros da Companhia (noviciado, escolasticato, regência, isto é, a prática do ensino nas classes inferiores) e a organização das Universidades que fundou e regentou, designadamente a de Évora, memorada por alguns dos seus mestres de Teologia, atentaremos somente no ensino franqueado a alunos leigos, cuja estrutura deu as raízes do nosso ensino liceal e se aparenta a instituições congéneres, notadamente ao plano colegial de João Sturm.
O Ratio studio rum estabelece como que dois cursos: o inferior (studia inferiora) e o superior (studia superiora), destinado ao estudo da Filosofia e da Teologia; nalguns colégios, notadamente em países de missão e para meninos com menos de 10-12 anos, que era a idade normal de entrada nos colégios, ministrou-se o ensino das primeiras letras (abecedarii).
O curso inferior preparatório, ginasial ou secundário, tinha por objeto o estudo da Gramática, das Humanidades e da Retórica, repartindo-se o respetivo estudo em cinco classes: três de Gramática (prima ou infima, secunda ou media e tertia ou suprema), uma de Humanidades e outra de Retórica.
Como os colégios da Companhia não ministravam o ensino das primeiras letras, salvo quando as circunstâncias locais o impunham, a admissão à primeira classe da Gramática só era permitida a alunos com instrução elementar. Cada classe tinha o seu professor; quando este não podia satisfazer as exigências docentes devido ao excessivo número de alunos, a classe era desdobrada, por forma que o mesmo programa fosse cumprido no mesmo espaço de tempo para a totalidade dos alunos da mesma classe.
Na primeira classe de Gramática estudavam-se os rudimentos da língua latina (declinações, conjugações e leitura de trechos seletos e de fábulas); na segunda, ensinava-se a Gramática por assim dizer em extensão e iniciava-se a leitura de autores, designadamente as epístolas de Cícero e as poesias mais fáceis de Ovídio; e na terceira, aprofundava-se o estudo gramatical, estudava-se a métrica e liam-se, no primeiro semestre, as epístolas de Cícero (a Ático e a Quinto) e Ovídio, e no segundo, obras de Cícero, notadamente os tratados morais, Catulo, Tibulo, Propércio e Virgílio.
Nos exercícios escritos, obedecia-se, em regra, ao seguinte esquema: na primeira classe, tema simples, de composição latina, de poucas linhas (quatro normalmente), em relação com as regras estudadas, e versão de frases curtas; na segunda, tema mais extenso de (sete linhas, normalmente) em relação com o conhecimento progressivo das regras da sintaxe, e versão de trechos de Cícero; na terceira, composição de cartas tendo por modelo as de Cícero.
O latim constituía o fundo do ensino da Gramática, cuja frequência durava, em regra, seis anos: um para as quatro primeiras classes e dois para a quinta. Os exames tinham lugar no fim do ano lectivo; nas classes de Gramática, além do exame final, faziam-se exames de passagem, pela Páscoa. Os alunos julgados aptos no exame de passagem podiam transitar para a classe imediata; não obstante, em virtude da diversidade dos programas, a passagem antecipada somente tinha lugar, em regra, nas duas primeiras classes de Gramática.