O Prof. Dr. M. Gonçalves Cerejeira, em O Humanismo em Portugal. Clenardo, Coimbra, 1926, pp. 95-97, publicou a lista dos lentes que leram neste primeiro ano da transferência da Universidade, conforme se encontra a p. 3 do livro III de Autos e Provas de Cursos de 153 7 até 1550 (Arquivo da Universidade de Coimbra)
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Resulta do documento não ser rigorosamente exata a afirmação de Leitão Ferreira de que todos os catedráticos da Universidade haviam começado a ler em 2 de Maio, pois Henrique Cuelhar iniciou o seu curso em 4 de Junho.
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[ XX ] (§ 47)
SOBRE AFONSO DE PRADO; SEU ENSINO TEOLÓGICO
E ALGUNS DADOS BIOGRÁFICOS
Como já dissemos na anotação ao § 8, Afonso de Prado veio de Alcalá de Henares, em 1535, para ensinar em Santa Cruz.
Segundo a notícia biográfica adiante reproduzida, ensinou Artes na Universidade de Alcalá, e Nicolau Antonio, na Bibliotheca Hisp. Nova (ed. de 1783, t. I, p. 41), informa haver publicado em 1530, na mesma cidade, pelo impressor Miguel de Eguia, umas Quaestiones Dialeticas supra libras Periermenias. Fol.
Bonilla y San Martín (Luis Vives y la filosofía dei Renascimiento, Madrid, 1903, p. 51 e respetiva nota) incluiu-o «entre los más decididos campeones de las reaccionárias huestes [anti-renascentistas], como para comprobar, según la feliz frase de Matamoros, cuanto más fecundas que otras algunas suelen ser las plantas cultivadas en estercoleros. Ahí están, si no, cual patentes testimonios, las Dialecticae Introductiones, de Juan de Celaya; el Tratatus de secundis intentionibus, del Maestro Francisco de Prado; el Tratatus de verbo mentis et syncategorematicis, de Fernando de Enzinas; y los nombres de Jerónimo Pardo, los Coroneles, Rodrigo de Cueto, Agustín Pérez de Oliva, Navero, Alonso de Prado, Sancho Carranza de Miranda, Fray Alonso de Córdoba, Gaspar Lax de Sarifiena y su discipulo Juam Dolz dei Castellar.»
Em Santa Cruz começou por ensinar Artes, certamente segundo a feição tradicional, na qual se educara e perseverara; no entanto, temos quase por seguro que fora contratado para ensinar teologia, como afirma Leitão Ferreira, ou, pelo menos viera nesta esperança, pois na carta que D. João III dirigiu a Fr. Brás de Braga em 27 de Maio de 1536 diz: «Ha o que em vosa carta dizeis sobre a cadeira da teologia que pedys pera o doutor prado eu como sabees nõ tenho ainda asemtado como se as cadeyras hão de dar ante tenho è vontade não se darem...» (M. Brandão, Documentos. cit., I, p. 15). Posteriormente volvidos alguns meses e antes da transferência da Universidade, D. João autorizou que Afonso de Prado ensinasse a Teologia em Santa Cruz; prova-o o alvará de 20 de Abril de 1537, pelo qual D. João III ordenou que as três cátedras de Teologia se lessem nos colégios do mosteiro, ficando os respetivos professores obrigados «a leer nos ditos Colegios e faram os exercicios e leram as lições como antes as lia e fazia e era obrigado fazer ho doutor prado... » (M. Brandão, Documentos..., cit., I, p. 28).
O magistério teológico de Afonso de Prado em Santa Cruz antes da transferência da Universidade, deve ter-se exercido apenas durante o ano anterior a esta transferência, e não como diz Leitão Ferreira, «por alguns annos».
Não possuímos informes acerca da orientação do ensino teológico de Afonso de Prado; suspeitamos, no entanto, que obedeceu ao critério tradicional, pois, como veremos no aditamento respetivo, é legítimo atribuir a Fr. Martinho de Ledesma a introdução em Coimbra do método salmanticense, em particular do de Fr. Francisco de Vitória.
O Regimento dos lentes de Teologia, Artes e Humanidades (pub,. pelo Dr. M. Brandão em Alguns documentos..., cit., pp. 155-156), ordenado por Fr. Brás de Braga para vigorar nos colégios de Santa Cruz enquanto não fossem unidos à Universidade, é meramente regulamentar; diz-nos apenas que o regente de Teologia grave leria uma lição diária e, se tivesse tempo, «tera seu circulo sem mais exercicio», e que o de Teologia escolástica leria também uma lição diária, no «ffim da qual ffara huüa pratiqua é q se resuma essa lyçam per os escolares, e à tarde ao tempo das reparações sera presente a concordar as desputas e questões q teram seus escolares (em fim das quaes brevemente abrira a materia da lyçam proxima). O que outrossy ffaraõ em as que teuerem ao sabado por a menhaã, em as quaes arguiram primeyro os Regentes dessa Faculdade e depoys os escolares, E esto basta esse dia aos ditos Regentes por lyçam. E se os ditos Regentes nom entrarem às regras e leerem as lycoés per o modo sobredito, sem remissam seram multados em seu salaryo pro rata é o que monta a cada lyçam e a multa será lancada em o eraryo dos collegios.»
Em 27 de Novembro de 1541 lavrou-se um auto de informação acerca do modo como liam os lentes e aproveitavam os ouvintes; como do documento anterior, dele constam tão-somente informes administrativos, que nada nos esclarecem sobre a orientação do ensino do Dr. Prado. Assim, o escolar D. Sancho [de Noronha?] declarou que o Dr. Prado «le sempre m» bem e suas liçoés m» estudadas e q ffaz mais do q he obriguado e que he homé de boa vida e exemplo faz m» fruyto.. »; D. Rodrigo Pereira, «nõ desfazendo nos outros», confessou que a «liçaõ do doctor prado curnúmente se té por milhor lida e estudada», e o mestre Antonio Vaz disse «que todos os lentes de theologia lê m. bè e suas liçoés m studadas prinçipalmente o doctor prado q le de modo q os Estudantes rrecebem fruyto... » (M. Brandão, Alguns documentos..., cit. p. 163).
No citado livro sobre Clenardo, Coimbra, 1926, p. 96, o Prof. Dr. Manuel Gonçalves Cerejeira deu pela primeira vez notícia da ordenação a Missa do doutor Afonso de Prado ter tido lugar em 26 de Maio de 1537, em Coimbra. «Encontra-se [esta notícia] a p. 136 verso do respetivo caderno das ordenações da diocese de Coimbra, preciosos manuscritos hoje incorporados no Arquivo da Universidade. Vem na Matricola das ordês-q celebrou dom pedro malheiro... em sabbado das quatro temporas da trimdade xxbj dias de maio de mil he quinhètos he trinta he sete anos, sob o Titulo dos ordenados a misa no d.t° dia de sabbado da trimdade, e reza assim: it. o doutor a.° do prado f.de gracia de donhas e de micia de madril m. na cidade de toledo freg. da madelena dos reinos de castela cõ l.do seu prelado.»
Por este documento, parece que o apelido Prado não era de família, tendo talvez sido adotado em referência ao local do nascimento.
É a seguinte a notícia biográfica a que aludimos:
«Affonso do Prado natural de Toledo estudou Filosofia na universidade de Alcalá de Enares e nella foi mestre em Artes e a insinou com reputação, e depois insinou a Theologia. A fama da sua sabidoria havendo chegado à noticia de El rey D. João III no tempo em que meditava reformar os Estudos da universidade, pedio ao Imperador Carlos V seu cunhado, que consedese licença ao Doutor Prado, para vir para Portugal, para o que El Rey o convidou com largo estipendio, e o nomeou para Lente de Prima de Theologia no anno de 1537, e principiou a ler em 2 de Mayo do dito anno, depois de hum trienio de leitura o encarregou o mesmo Rey da regencia da mesma cadeira por Provisão de 13 de Setembro de 1542, e se lhe concedeu a propriedade perpetua, em quanto não se lhe dese algum emprego incompativel, por Provisão de 24 de Outubro do mesmo anno, e que atendendo às suas letras e virtudes o proveria em huma Igreja, ou beneficio. Foi Vice-Reytor, e S. Magestade atendendo ao seu notorio merecimento o nomeou Reytor da universidade por Carta de 28 de Setembro de 1555, porem nunca interrompeo a leitura, athe que jubilou de que se lhe passou Carta em 11 de Outubro de 1557. Pregou nas exequias que a universidade fes ao Principe D. João Pay do Rey D. Sebastião. Compoz — 1.0 Questiones dialecticas super libros Piermenias. Compluti. 1530. Fol.