[ XXVI ] (§ 120)
SOBRE DIOGO DE MURÇA E JOÃO DRIEDOENS
Entre os mestres que Fr. Diogo de Murça ouviu em Lovaina deve contar-se João Driedoens, de Turnhout, seis vezes decano da Faculdade de Teologia lovaniense entre os anos de 1515-1531, e reitor da Universidade em 1518 e 1533.
João Driedoens faleceu em 4 de Agosto de 1535 (vid. Opus epistolarum Des. Erasmi, ed. Allen, t. IV, Oxford, 1922, p. 390, nota). Fr. Diogo de Murça possuiu alguns livros de João Driedoens (veja-se na cont. das Noticias Chronologicas a notação referente ao colégio de São Jerónimo, no ano de 1549), e por informação, que hoje não podemos precisar, recordamo-nos haver lido que um destes livros contém uma epístola dedicatória a Diogo de Murça.
[ XXVII ] (§ 142)
Esta obra é realmente de D. João de Castro, como declara o respetivo título: Discurso da vida do sempre bem vindo, el apparecido Rey Dom Sebastiam nosso senhor o Encuberto des do seu naçimëto tee o presente: feyto & dirigido por Dom Ioam de Castro aos tres Estados do Reyno de Portugal: conuen a saber ao da Nobreza, ao da Clerezia, E ao do Pouo.
Em Paris, por Martim Verac, morador na rua de Judas M.D.C.II. Com priuilegio de El Rey.
Este livro tem uma Ajunta ao Discvrso preçedente aos mesmos Estados pello mesmo Autor: em a qual os aduirte de como El Rey de Hespanha se ouue com El Rey Dom Sebastiam, depois que o teue em seu poder. 1602.
[ XXXVIII ] (§ 150)
Na abundante matéria deste parágrafo, três pontos, pelo menos, têm hoje bibliografia, correção e desenvolvimento:
1) Sobre Marcos Romeiro e o ensino da Teologia no Mosteiro da Costa
O Doutor Marcos Romeiro, ou Romeu, contrariamente à opinião de Leitão Ferreira, foi em 1540 mestre no Colégio da Costa, de cujo ensino teológico nos deixou um valioso relato na carta que dirigiu a D. João III em 1 de Novembro deste mesmo ano, a qual foi publicada pelo Dr. Mário Brandão em Alguns documentos... cit., pp. 50-51.
Por esta carta sabemos:
a) Que o ensino da Gramática e das Artes era «como o de Paris». Esta expressão é bastante vaga; em todo o caso parece significar que no mosteiro da Costa se adotaram os métodos e compêndios seguidos «em Paris», ignorando-se, porém, que colégio parisiense servira de modelo.
b) Que o ensino da Teologia obedecia à seguinte distribuição dos tempos escolares:
1) lição matinal, de hora e meia a duas horas. Terminada a lição, na presença do lente, reuniam-se os auditores para fazerem entre si «conferência e questões do que ouviram», resolvendo o lente as dúvidas propostas;
2) depois «de comer», possivelmente à tarde, um dos auditores «repetia» a lição, terminada a qual os auditores, dirigidos pelo preceptor, argumentavam com o repetente, propondo-lhes dúvidas;
3) às sextas-feiras realizavam-se as «disputas maiores», nas quais um dos auditores, por ordem, «defendia» tudo o que se havia lido durante a semana;
4) finalmente, lia-se ainda diariamente uma lição de São Paulo, sendo também «defendida» a matéria lida durante a semana numa sessão especial.
Não nos elucida o Dr. Marcos Romeiro acerca dos mestres e das matérias ensinadas; diz-nos apenas que os estudantes eram «contínuos em falar latim, no que se põe grande diligência e vigilância, porque o falar latim e entende-lo bem é o princípio de todalas doutrinas». O Dr. Marcos Romeiro falava com desvanecimento desta formação latina, que concorria para o «acrescentamento das letras» graças à qual, se el-rei amparasse o colégio, não seria «necessário mendicar as letras fora da própria terra com muito detrimento da vida e excessivos gastos, do que já de muitos anos a esta parte não temos que nos queixar».
2) Sobre Pedro Margalho, lente de Teologia no Mosteiro da Costa
O Prof. Dr. Gonçalves Cerejeira, no citado Clenardo (2.a ed.), pp. 77-78, nota acerca de Pedro Margalho ter sido mestre do senhor D. Duarte, filho natural do rei, que o facto é afirmado «por D. Rodrigo da Cunha e o autor anónimo das Memorias dos estudos em que se criarão os monges de S. Jeronymo, 1772, que conheceu o cartório da sua Ordem. D. Duarte foi posto no convento da Costa... desde 1537 a 1543, segundo este cronista, onde concluiu os seus estudos. Se Margalho efetivamente lhe ensinou a Teologia, deve ter sido nos últimos tempos da sua estada na Costa. Assim como André de Resende em 1550 foi ensinar ao Colégio das Artes a Coimbra, voltando logo à sua querida Évora, o doutor Margalho também, para comprazer ao Rei, é possível deixasse por algum tempo o pingue remanso da sua conesia eborense, para ir dar o remate da formação teológica ao régio bastardo».
3) Sobre D. António, futuro Prior do Crato, no mosteiro de Santa Cruz
No Antiquário Conimbricense (Coimbra, 1841) foi publicada integralmente a carta do Infante D. Luís de 20 de Fevereiro de 1549, referida por Leitão Ferreira:
«Carta do Infante D. Luiz ao Prior Mor de Santa Cruz, sobre a educação de D. António.
«Padre Prior ho Infante vos envio muyto saudar. Tenho enformação do cuydado, e diligencia que pondes em a criação de Frei Antonio. Ho que vos muyto agradeço. Em tudo fazeis como quem sões, e como se de vosespera, e por que nunca vos escrevi, ho modo que hei por bem, que frei Antonio sigua em quanto estever nessa casa, volo quis nesta Carta declarar, confórme ao que tenho escrito por algüas vezes ao Bispo. E pera isto convem que vos diga ho que delle quero. Primeiramente que tema a Deus, e seja muyto vertuoso, e se esmere em todalas cousas que convem á religiaõ. Depois disso que seja tão deligente em seu estudo que nenhü de seus condicipulos lhe leve a vantagem. Porque assas quebra sua sera, tendo tantas ajudas de idade, engenho, tempo e disposição pera ser eminente em letras, esquecer-se da obrigação que tem per ser quem é, e indo outros diante, deixarse ficar atras, ho que seria contra ho que cumpre á sua honra, e á conservação do contentamento que eu delle tenho. Confio nelle que folgue nisto, e em tudo de me fazer ha vontade. Mas porque sua idade nom é ainda tão madura, que possa sintir perfeitamente, quanto nisto lhe vay, vos rogo, e encomendo muyto, que per todolos meyos que poderdes ho animeis e amoesteis, e trabalheis, pera que elle creça asi na devação, e amor de Deus que é ho principal, como no cuydado de seu estudo. E por que nenhüa cousa destas se pode facilmente effeituar sem obediencia ha qual é fundamento de todalas outras vertudes, hei por bem, que em tudo vos obedeça como qualquer religioso que tenha feito profissão nessa casa, em vossas mãos, e milhor se milhor poder ser. esta foi minha temção no principio desta mudança, e asi ho escrevi então ao Bispo. Espero que frei Antonio, sabendo quanto eu com isso folgarei, nom saia per nenhúa via de vosso mandado. e Quando ho contrairo fezesse, seria caminho pera eu nom fazer delle o fundamento que faço ho que nunca Deus queira. e pois nisto tanto vay, vos encarrego ha conciencia, que todalas vezes que vos elle em algúa cousa desobedecer, me aviseis de tudo, pera que eu nisso faça ho que for bem. e fazendo ho contrairo fareis muito contra ho que deveis a deus, e contra a confiança que de vossa vertude tenho. bem sei quão grande carga é esta que vos dou. Mas quando vos lembrar ho serviço que nisso fazeis a deus achalaheis muyto leve. Eu serei sempre em tanto conhecimento do que por este respeito vos devo como vereis por experiencia, quando vos de mim algüa cousa comprir. Ho que me parece bem se ordene de suas lições, vos dira Jeronymo do Souto. Deste Almeirim oje XX dias de fevereiro de 1549.Infante Dom Luiz.»