Segunda Parte - que compreende os anos que discorrem desde princípio do de 1541 até fim do de 1547 (II)

«Os doutorandos antes da Reforma defendiam conclusões em tres atos, que segundo a nomenclatura adoptada para os de Theologia, se designavam Magna ordina ria — Augustiniana e Quodlibetos. Em Medicina chamava-se Regio o ato correspondente à Augustiniana. De todos o mais apparatoso, e o que versava em theses ex universa Facultate Depromptae, era o ato dos Quodlibetos, cujas práticas serviram de modelo ao de conclusões magnas decretado nos Estatutos Novos.

«As theses propunham-se geralmente não em forma de proposições destacadas e concisas, mas sim em discurso ligado, referido ou a todas as matérias professadas na Faculdade, ou somente a algumas partes da sciencia. Foi tambem d'este modo que se começaram a propor as theses depois da Reforma; em breve porém se introduziu o costume que ainda hoje subsiste. Parecia que em atos de tanta seriedade deveria haver a compostura e o recato proprio de pessoas illustradas, do logar e do assumpto. Infelizmente não acontecia assim. Deram-se frequentemente conflitos ruidosos. Toleravam-se pelo habito, e até certo ponto eram bem recebidos alguns remoques e dictos picantes; mas raras vezes ficavam nos limites da paciencia.          

«O costume de reciprocas invectivas foi originado da emulação entre os collegios das ordens monasticas aggregadas à Universidade. A reforma não extinguiu nem moderou semelhante emulação; por isso quando os gracianos apanhavam no banco dos defendentes algum dominicano, ou vice-versa, era contar que havia azedume na discussão.»         

[ XL ]                                                                                                                                                     (§ 182)

João Dias é referido no Alphabeto dos Lentes como lente de Código com as indicações deste parágrafo; não se encontra, porém, a provisão da sua nomeação nos Documentos de D. João III, publicados pelo Dr. Mário Brandão, relativos a este ano de 1544.

[ XLI ]

ADITAMENTO ÀS NOTICIAS CHRONOLOGICAS DA UNIVERSIDADE RELATIVAS AO ANO DE 1544

De harmonia com o plano seguido anteriormente, juntaremos ao presente aditamento algumas notícias que Leitão Ferreira deixou no olvido, repartindo-as pelos respetivos assuntos.      

I

ESTATUTOS NOVOS

Como dissemos, a Universidade, após a sua trasladação para Coimbra, regeu-se pelos Estatutos concedidos por D. Manuel à Universidade de Lisboa, com as modificações introduzidas posteriormente por legislação avulsa, da qual demos conta nos respetivos anos.             

Neste ano de 1544. Porém, D. João III estabeleceu novos Estatutos, que na ordem cronológica das disposições fundamentais da Universidade portuguesa devem ser contados como Quartos Estatutos.       

O seu texto, no original como nas cópias, não existe no Arquivo da Universidade, e parece mesmo, pelo silêncio dos investigadores, que não existem esperanças de se encontrar no Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Este facto, deu ensejo a que se lhes contestasse a existência. Porém é fora de dúvida que foram decretados e vigoraram até à reforma de 1559, conhecida geralmente pelos quartos Estatutos, mas em rigor histórico os quintos.           

Com efeito, pelas cartas de D. João III de 20 de Setembro de 1544, dirigidas respetivamente ao Cancelário da Universidade e a Fr. Brás de Braga, publicadas pelo Dr. Mário Brandão nos citados Documentos de·D. João III, pp. 192 e 193, se lhes anunciam o decreto destes Estatutos: 

- ao Padre prior Cancelário, diz haver ordenado «ora ho modo em que se os estatutos da dita vniversidade devem comprir & guardar por atee ho presemte lhe nam ter dados estatutos seguúdo ueres per o caderno dos ditos estatutos per mim asinado que leua o padre ffrey diogo de murça Reitor da dita vniuersidade pelo que vos ëcomendo & mando que nas cousas que tocam o voso oficio de camçelareo vses do comteudo nos ditos estatutos.»            

- e a Fr. Brás de Braga, comunica que «Por eu ate agora naõ ter dados estatutos a essa Vnid.e de Coimbra e se regerem até aqui pellos estatutos de L. e por outras provizoens m.q sobre o Regim» da ditta vnid.e passei ordenei agora estatutos p a dita Vnid.se Reger e governar sego vereis por os ditos estatutos por mim assignados dos quais hej por bem q se vze... e escrevo ao P. Per Cancellario q vze delles.. »    

Comprova-se, pois, indiscutivelmente a existência destes estatutos, trazidos para Coimbra pelo próprio Reitor da Universidade, Fr. Diogo de Murça; porém sobre o seu conteúdo nada sabemos de preciso, visto haverem-se perdido.

Sabe-se, por exemplo, que eles estabeleceram um novo regime de votação nas oposições às Cátedras (vid. neste aditamento, a notícia sobre Rui Gomes Teixeira), e da leitura das lições (idem, sobre António Caiado), mas ignoramos os respetivos regimentos.

Quanto à Real Capela da Universidade, observou o Prof. Dr. António Garcia Ribeiro de Vasconcelos no seu estudo sobre a Real Cape lia da Universidade (Alguns apontamentos e notas para a sua história), Coimbra, 1908, p. 22:

«Nos estatutos de D. João III dados em 1544, de cuja existência, até há pouco tempo muito contestada, existem numerosos vestígios nos livros de escrituração, que a eles fazem frequentes referências, encontravam-se sem dúvida disposições sobre a real capela e sobre o culto divino nela exercido. As multas e descontos nas terças de cada ano impostas pelo conselho dos deputados aos capelães da Universidade, por falta de cumprimento das respetivas obrigações, supõem estes serviços devidamente estabelecidos e regulamentados. Além disso temos a notar, que em 1557 o conselho dos deputados e conselheiros resolveu a 16 de Outubro adquirir umas alfaias, que eram de urgente necessidade, a custo das Rendas da vnivers.ate vir a provisam q na Reformaçam dos estatutos era feita sobre a dita capella; o que bem mostra que o visitador-reformador, Baltasar de Faria, na visitação feita no anterior ano de 1556, desde 19 de Fevereiro em que tomou posse, até 1 de Setembro em que se despediu do claustro--pleno, notara algumas reformas ou adicionamentos a fazer ao estatuto, relativamente ao regime e dotação da capela.»

II

DISPOSIÇÕES DIVERSAS RELATIVAS A UNIVERSIDADE

1) Sobre as precedências nas procissões

Por carta de resposta dirigida à Universidade por D. João III em 30 de Fevereiro de 1544, se sabe que houve algumas diferenças entre os religiosos mendicantes dos colégios universitários «sobre a preçedençia de quem hiria detras ou diante nas procisoês», e que El-rei aprovara o procedimento do Reitor ouvindo sobre o caso os reitores dos colégios e os doutores Morgoviejo e Bartolomeu Filipe. Com os reitores dos dominicanos e agostinhos estabelecera o Reitor da Universidade um acordo; mas porque os carmelitas nele não participaram, recomendava El-rei ao Reitor da Universidade que aguardasse o parecer dos respetivos prelados, cujas razões devia ouvir «muy inteiramente».            


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Vamos corrigir esse problema