Segunda Parte - que compreende os anos que discorrem desde princípio do de 1541 até fim do de 1547 (II)

Esta referência mostra que a oração de Sapiência foi proferida no mosteiro de Santa Cruz nos anos letivos de 1538-1539 e 1539-1540.         

2) Plano de estudos das Faculdades de Leis e de Cânones         

Como dissemos no volume anterior das Noticias Chronologicas, p. 762, cumpria ao Reitor da Universidade fixar anualmente a matéria das lições. Dando execução ao Regimento, D. Fr. Bernardo da Cruz notou uma «novidade» na cátedra de Véspera de leis, a qual consistia em lhe solicitarem que prescrevesse o título das Ações. O Reitor, estranhando o pedido,         

certamente por o julgar deslocado do objeto da cadeira, ordenou que lhe apresentassem outro título, o qual foi De verborum. O conselho hesitou em se pronunciar, e por isso o Reitor resolveu submeter o assunto à decisão régia, a qual se verificou pela carta de 26 de Julho de 1541 determinando que na Cátedra de Véspera de Leis se lesse o título De verborum, e que o título Das ações fosse lido, no ano letivo 1541-1542, por um dos lentes de Instituta, que o Reitor designasse.

Além desta prescrição, a referida carta determinou ainda, como interpretação do Regimento de 9 de Novembro de 1537, que os lentes das cadeiras grandes de Leis e Cânones repetissem e os das cadeiras pequenas fizessem conclusões.

Originaria esta determinação, que em nada alterou o referido Regimento, a rabulice dos lentes das cadeiras pequenas, cujos ordenados oscilavam entre 60 e 130 mil réis, mediante a qual pretendiam justificar o não fazerem conclusões nem repetições: pelo ordenado entendiam que as suas cátedras estavam equiparadas às cátedras grandes, pelo que se dispensavam de fazer «conclusões», e pela categoria, as suas cátedras eram consideradas pequenas, pelo que se dispensavam de fazer «repetições».

Finalmente, a carta régia de 1 de Setembro de 1541 impôs que se fixasse a todos os lentes das faculdades jurídicas a matéria que deveriam ler em cada uma das terças do ano, tão imperativamente que o recebedor lhes não poderia pagar os ordenados sem apresentarem certidão do Reitor da Universidade comprovativa de haverem lido a matéria consignada às lições da respetiva terça, sob pena de perderem metade do ordenado correspondente a essa terça.

Esta disposição, que particularizava a cada uma das terças do ano letivo o que os regimentos de 17 de Setembro e 13 de Outubro de 1539 haviam estabelecido para todo o ano escolar (vid. Noticas Chronologicas, II, pp. 761-762), resultou da circunstância dos estudantes de Instituta, isto é do primeiro ano, a de Decretais, lerem, fora dos programas destas cadeiras, «Doctores que nam entemdem nem os aviam de começar abrir atee o terceiro e quarto ano».

Esta prática, que, segundo parece, se tornou correntia, era considerada, justamente, antipedagógica, porque os estudantes não só confundiam «seus engenhos» como consumiam o tempo durante o qual deviam fazer-se «boõs textuaes. q he o principall nos dereitos» em ler livros para que não estavam preparados e só deviam ler nos últimos anos do curso. Para obviar a esta «cousa m.t° Reprouada & defemdida» em todas as Universidades, propunha o Reitor da Universidade que «seria m.t° proueitoso mãdar q nhuu legista ou canonista atee auer ouujdo tres anos Inteiros ao menos podese comprar Doctor alguü em dereytos nem telos é seus estudos sob hüa çerta pena & q asy nhuü liureyro lhos podese vender sob a mesma pena sem ver çertidam do rector de como ja estudou tres anos». Esta proposta, verdadeiramente inquisitorial e que não desmente o que se sabe do carácter de D. Fr. Bernardo da Cruz, não foi atendida. É possível que D. João III a considerasse impraticável; da sua carta, porém, consta que não atribuiu a referida prática apenas à curiosidade dos estudantes, porque poderia pensar-se que a culpa cabia aos lentes das cadeiras pequenas, que, em vez de «lerem a pasar», se detinham com explanações, «querendo examinar matérias». Por esta razão, não despachou no sentido proposto pelo Reitor, e determinou a referida prescrição de se assinar a cada terça do ano letivo a respetiva matéria das lições (vid. M. Brandão, Documentos..., cit., vol. II, pp. 45, 46 e 52).

3) Constituição de júris

Pelo alvará de 20 de Setembro de 1541 foi determinado que os licenciados deixassem de fazer parte dos júris de exames e de receber as respetivas propinas (M. Brandão, eo. loc., p. 54). Esta exclusão, que revogava os Estatutos Manuelinos e o Regimento de 9 de Novembro de 1537 (vid. Noticias Chronologicas, II, p. 433), é explicável, a nosso ver, pela circunstância da Universidade ter completos os seus quadros docentes e haver já um número suficiente de novos doutores.

O mesmo alvará proibiu os doutores que não tivessem capelos nem insígnias de fazerem parte dos júris e de receberem propinas.

4) Regimento dos exames de bacharelato

O alvará de 24 de Outubro de 1541 (M. Brandão, ibid., pp. 62-65) estabeleceu as seguintes disposições:

a) oito dias antes do sábado em cuja tarde se marcaria o ponto para o exame do primeiro candidato, o Reitor convocaria os lentes que fossem deputados e os conselheiros e deputados não lentes, assim como os estudantes ao exame de bacharelato. A reunião tinha por fim verificar se os candidatos alegavam ou não motivos de suspeição contra qualquer vogal do júri, relativamente a «seus exsames & preçedencias».

Se qualquer dos candidatos invocasse suspeição, cumpria ao Reitor ordenar-lhe que as fundamentasse imediatamente, lavrando-se um auto redigido pelo bedel. O Conselho apreciaria estes fundamentos; se os considerasse legítimos, isto é, suficientemente provados, ipso facto seria deferida a suspeição, se fossem controversos, dar-se-ia o prazo de três dias aos acusadores para provarem a suspeição, não podendo apresentar mais de quatro testemunhas. Decorridos os três dias, o reitor convocaria novamente o Conselho, que sumariamente julgaria o processo, sem dele dar vista às partes.

b) Em princípio, todos os exames de bacharéis deviam fazer-se numa semana, de sábado a sábado. Iniciar-se-ia o serviço na tarde de um sábado, com a marcação do ponto para o primeiro candidato, cuja prova se faria 24 horas depois, isto é, no domingo.

Diariamente apenas se examinariam dois candidatos, e se o serviço não pudesse completar-se numa semana passaria para a semana seguinte, por forma que o candidato tivesse sempre 24 horas de ponto.

Quanto à matéria dos pontos, a carta de 24 de Outubro de 1541 (M. Brandão, ibid.., p. 68) estabeleceu alguns princípios, que em rigor, condenavam uma prática até então corrente.

Observara o Reitor a D. João III que se tornara costume fixar a lição de ponto do exame dos bacharéis apenas na matéria do Esforçado; a consequência era que os estudantes, quando frequentavam a cadeira introdutória de Instituta logo começavam a estudar o In Fortiatum, e do mesmo modo, quando frequentavam a cadeira de Código, por forma que descuravam as demais matérias para só estudarem «é- ultimas vontades», o que claramente se via em todos. Para obviar a estes inconvenientes, sob proposta do Reitor, determinou esta carta que o ponto fosse indiferentemente marcado «em todo o corpo do Direito», isto é, no Código, nos Digestos e no Esforçado «a huü é buil E a outr° é outr° de mania que nhuü pode ter çerteza de homde lha aviaõ Dasynar». Desta maneira estudariam mais e «farsehyão vniuerssaês & letrados perffeitos».


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Vamos corrigir esse problema