Vejamos, porém, dum modo muito geral, a atividade do Congresso. Dos institutos espanhóis o que mais contribuiu foi o «Colegio de Estudios Superiores de Deusto» (Universidade de Deusto).
Os seus professores os Padres Nemezio Güenechea e Ramón Zurbano versaram o tema «Suárez mestre de direito internacional»: aquele referindo-se especialmente à comunidade jurídica internacional, ao Jus gentium e direito internacional e às aplicações do direito internacional privado, este, às doutrinas de Suárez sobre a guerra. Luiz Izaga dissertou sobre «A autoridade suprema civil segundo Suárez», e Garcia Herrero expôs algumas «Questões sobre a lei penal segundo a doutrina do P.< E Suárez».
Os Padres Sainz e Mostaza, professores do Seminário Pontifício de Comillas, ocuparam-se respetivamente de «Suárez exegeta» e «O direito consuetudinário em Suárez»; e Eugénio Cantera, o único sacerdote não jesuíta que colaborou no Congresso, expôs um trabalho sobre a oposição das doutrinas de Suárez ao imanentismo. Dos estrangeiros, só Paul Dudon usou da palavra, falando sobre a teoria política de Suárez tal como a revelam a Defensio fidei e o liv. III De legibus, comparando-a especialmente com as de Maquiavel, Grocio e Hobbes, Bossuet, Montesquieu e Lamennais.
As teses que estes congressistas propunham, suscitaram por vezes discussões, graves e comedidas sempre, que incidiram particularmente sobre a sua redação. Votadas, constituíram as conclusões do Congresso, das quais transcrevemos as seguintes:
1. — Secção de Apologética
(3 conclusões)
3.a — Considerando os grandes perigos que para a pureza da fé católica, contêm a admissão exclusiva ou principal da imanência na defesa da verdade cristã, o C. reprova a imanência não só como doutrina, mas também como método apologético, conforme as doutrinas sobre este assunto contidas nas disposições pontifícias.
II. — Secção de Direito Internacional
(7 conclusões)
1.a — 0 C. faz votos por que, sem menoscabo da legítima soberania e independência das nações se estreitem cada vez mais os vínculos da grande sociedade internacional, fundados, como diz Suárez, no preceito natural do amor recíproco e misericórdia, extensível a todos os homens.
3.a —Um dos princípios que mais conviria inculcar aos povos é que a arbitragem, sendo possível obrigatória, constituiria o meio mais racional para resolver os litígios entre os Estados.
C. faz seus os princípios de Suárez sobre o direito do Sumo Pontífice intervir nos conflitos internacionais, em certos casos determinados pelos doutores católicos; mas limitando-se à questão da arbitragem propriamente dita, proclama que o Pontífice Romano, pelo carácter da sua personalidade jurídica universal, pela natureza do seu governo paternal, pela segurança das suas decisões comprovadas por tantos e tão indiscutíveis títulos históricos, é a pessoa que mais garantia oferece de acerto, imparcialidade e Justiça.
III. — Secção Jurídico-social
a) Direito político (3 concl.).
1.a — Toda a filosofia política de Suárez se funda no princípio da suprema autoridade civil derivar de Deus, que a comunica à sociedade civil perfeita como um atributo conatural e inerente.
b) Direito consuetudinário (4 concl.)
1.a — Para definir e explicar a natureza do Direito consuetudinário o C. prefere e adota como sua a doutrina claramente exposta por Suárez no liv. VII De legibus.
2.a — Por consequência, repelindo como infundadas e perigosas para o regime social as teorias do racionalismo e do positivismo histórico, o C. estabelece com Suárez que o costume jurídico é um direito legal objetivo, não escrito, introduzido por uma larga observância do povo, com o consentimento, pelo menos legal, do legislador.
c) Direito penal (6 concl.).
2.a — É necessário admitir, para defesa dos interesses sociais, no direito penal, como no direito civil, o costume e o direito natural, com as limitações referidas por Suárez.
5.a — Deve dar-se a maior latitude, em matéria penal, à apreciação dos juízes, conforme a doutrina de Suárez, igualmente afastada da escola clássica e positiva.
O C. ocupou-se, assim, predominantemente de assuntos jurídicos e apologéticos. Algumas memórias, porém, foram apresentadas, versando outras secções; mas a autoridade superior julgou prudente limitar a atividade do C. para evitar polémicas que as conclusões teológicas ou filosóficas certamente suscitariam. Entre estes trabalhos dominam os dos portugueses. A missão universitária contribuiu com três estudos: O P.' Francisco Suárez em Coimbra (Notas sobre alguns dos seus contemporâneos e amigos), do Prof. Dr. Eugénio de Castro; Suárez, jurista (O problema da origem do poder civil), do Prof. Dr. Manuel Paulo Merêa, e A teoria da verdade e do erro nas «Disputationes Metaphysicae» de Francisco Suárez , do Dr. Joaquim de Carvalho e os Padres Luís Gonzaga de Azevedo, António de Meneses e Joaquim Abranches, respetivamente com Suárez e o regalista Gabriel Pereira de Castro, A origem do poder e a Formação intelectual de Suárez. Independentemente das secções do C., mas em homenagem à sua celebração, o P. e Francisco Rodríguez ofereceu o estudo A formação intelectual do jesuíta.
A última sessão foi no dia 29; todavia não ficou o C. definitivamente encerrado, esperando a Junta o momento oportuno, que só a paz trará, decerto. Uma das sessões, e das mais memoráveis, a do dia 27, foi dedicada às missões estrangeiras. Mgr. Butt, bispo de Cambisopolis, recordando os laços históricos que unem os católicos da Grã-Bretanha à Espanha católica, terminou aspirando que a doutrina cristã fosse a lei suprema dos povos e a garantia da paz duradoura, que só ela pode dar.
Mgr. Baudrillart transmitiu, com muito patriotismo, as homenagens dos bispos protetores do Instituto Católico de Paris e do seu corpo docente, formulando o voto que as doutrinas de Suárez pudessem restabelecer o direito das gentes e o respeito pela Justiça. Usa então da palavra o Dr. José Alberto dos Reis. No seu discurso, o Dr. Alberto dos Reis depois de saudar a Universidade de Granada, a comissão promotora do centenário e os congressistas, em nome da Universidade de Coimbra, procurou salientar os serviços que a esta Universidade prestou o Padre Francisco Suárez com o seu ensino de Teólogo eminente e com as suas variadas obras, em que o nome do autor era acompanhado destes dizeres: Primarius sacrae Theologiae in celebri Conimbricensi Academia Professor; e como estas obras tiveram uma repercussão e um acolhimento extraordinário em todo o mundo culto, daí veio, observou o orador, que os créditos e o lustre da Universidade de Coimbra irradiaram então luminosamente por todas as esferas civilizadas, visto que as honras e os triunfos de Suárez vinham, em última análise, recair sobre a Academia de que era professor. Em seguida, o comissionado da Universidade de Coimbra aludiu à publicação, em 1897, do livro do Dr. António de Vasconcelos, Francisco Suárez, Doctor Eximivs, com a qual a Universidade começara a exonerar-se da dívida de gratidão para com a memória de Suárez, e pôs em relevo os merecimentos desse livro, justamente exaltados na mais notável biografia de Suárez, a do Padre Raoul de Scorraille; mas, acrescentou, a referida homenagem não podia dispensar a Universidade de se fazer representar no centenário de Suárez e de contribuir para o brilho do congresso com toda a colaboração que estivesse ao seu alcance. Então, mostrou quais haviam sido os esforços da Universidade de Coimbra no sentido de assegurar a sua representação científica no congresso. Apresentou a memória do Dr. Eugénio de Castro, em que o primoroso artista faz desfilar diante de nós, como numa tela elegante e clássica, as figuras que viveram em Coimbra no tempo de Suárez e com ele estiveram em contato; referiu-se depois ao trabalho valioso do Dr. Joaquim de Carvalho sobre a Teoria da verdade e do erro nas «Disputationes Metaphysicae» de Suárez, lendo as conclusões, rigorosamente deduzidas, de tão proficiente estudo filosófico; por fim, ocupou-se da memória do Dr. Manuel Paulo Merêa, Suarez, jurista (O problema da origem do poder civil), leu as proposições que resumem a doutrina de Suárez e pôs em relevo a impecável consciência e probidade com que fora elaborada uma memória sobre assunto tão delicado, e ao mesmo tempo o valor literário e científico desse trabalho, sem dúvida um dos mais notáveis que foram presentes ao congresso. De tudo isto, concluiu o orador que a Universidade de Coimbra se empenhara em levar ao congresso a sua cooperação, tão assinalada quanto o haviam consentido as ocupações profissionais dos seus professores e o reduzido tempo que mediara entre o convite e a comemoração.