Capítulo III

Do uso do relógio para se saber o caminho no mar de Leste-Oeste

“Para o uso deste relógio ser de proveito é necessário advertir algumas coisas. Primeira, que se há de pôr no lugar em que a nau for mais quieta, e em que houver campo para habitarem os que hão de vigiar e virar o relógio, e juntamente no lugar em que possa estar candeia de noite. Este pode ser o pé do mastro grande na estrinca, porque aí se acham todas estas coisas, como terá notado quem navegou em nau da Índia.

“Segunda, que depois que, posto o relógio no sítio e lugar em que houver de estar, será examinado na mesma nau, estando ainda no porto, fazendo em terra a linha meridiana, ou tomando o meio-dia, pelo astrolábio, virando então o relógio e fazendo que a areia comece a correr neste mesmo ponto.

“E quando ao outro dia ao meio-dia, dadas as voltas ao relógio, como fica dito, acabar a areia de correr, estará a obra perfeita. E isto será melhor quanto mais vezes se fizer a prova antes de as naus partirem do porto.

“Terceira, que um dia ou dois ou quantos quiserem, antes que a nau dê à vela se tomará o meio-dia pelo astrolábio. E no ponto em que for meio-dia começará a correr a areia sem que dali por diante pare. Para o que haverá dois oficiais que o vigiem e virem de 6 em 6 horas, ou de 12 em 12, ou de 24 em 24 horas, e estes podem ser os mesmos estrinqueiros que moram onde o relógio há de ir.

“Nem pareça isto muito trabalho porque, se se fizer com diligência, escusar-se-á o muito trabalho que hoje tem os que navegam, pois não será necessário ter conta alguma acerca do relógio, nem ver o rumo que a nau leva, nem se vai para esta nem para aquela banda, nem serão necessários Regimentos alguns semelhantes aos que costumam para se saber a altura.

“Quarta, e para saber o navegante se está a Leste ou a Oeste há de tomar pelo astrolábio o meio-dia do lugar aonde está a nau, e logo nesse ponto verá como está o relógio, e se a areia então acabou de correr. É certo que está no meridiano de Lisboa donde suponho que a nau saiu. Se falta alguma areia por cair abaixo verei pela repartição das horas, e graus que tem o relógio, sendo cada hora repartida em 15 partes que responderão a 15 graus. E quantos desses graus apontar a areia na âmbula de cima, tantos é certo que a nau está para Leste, contando do meridiano de Lisboa, dando a cada grau 17 léguas e meia ou menos no globo conforme o paralelo da altura que tiver.

“Se contudo correu toda a areia antes do meio-dia notarei (tornando a virar o relógio) quantos graus estão descobertos dela, pela parte de cima da âmbula, no ponto do meio-dia, e tantos estará a nau para Oeste.

“Perguntará alguém como podem as horas medidas pela areia governar o navegante exatamente, se a areia corre mais depressa no princípio quando o relógio está cheio, do que no fim por causa do maior ou menor peso da areia; a esta dificuldade se responderá no capítulo seguinte.


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