IV. As corporações de ofícios e a preparação de artífices. O ensino particular. As escolas municipais

As corporações de ofícios, o desenvolvimento da burguesia nalgumas cidades florescentes pela atividade mercantil, a expansão das relações comerciais nos países do Mediterrâneo e do Mar do Norte, o exercício de franquias e foros comunais, deram ensejo, a par de outros factores, a modalidades de ensino diversas do das escolas eclesiásticas, monásticas e catedrais, cuja importância, capital na atividade docente da alta Idade Média, decaiu com o desenvolvimento das Universidades.

A organização dos ofícios e mesteres em «corporações» foi um movimento característico da sociedade medieval posterior ao século XII, que se tornou extensivo a todo o Ocidente. As «corporações» (grémios, confréries, guilds, Gilden, etc.) constituíram-se como agremiações profissionais, que sob a invocação de um santo, celebravam práticas religiosas e procuravam a defesa dos interesses comuns. A par do auxílio-mútuo, animava-as o sentimento de autonomia.

Em relação ao objeto que nos importa, cumpre notar, principalmente, o interesse que votaram à preparação dos futuros artífices e mesteirais, instituindo o esboço do ensino profissional. Organizado principalmente para os filhos dos agremiados, o principiante, «aprendiz», era iniciado na prática manual do ofício, ampliando-a, por vezes, com o ensino elementar do latim e de conhecimentos gerais, ministrados, em regra, por um sacerdote.

Uma vez adestrado na prática do «ofício», o «aprendiz» ascendia a «companheiro» ou «oficial», depois de prestar provas perante o «mestre», que era eleito pelos oficiais da corporação. O ensino das corporações teve, assim, por desígnio a formação do artífice manual, acompanhado da consciência profissional, não desligada, como é óbvio, dos vínculos ético--religiosos que estruturavam a sociedade medieval e deram fisionomia própria a estas instituições.

O ingresso nos grémios de comerciantes, designados de «hansas» nos países teutónicos, também era precedido de provas, sendo por vezes o novato recebido com troças e motejos, à maneira do que se tornou trivial na entrada de novos membros para as corporações de ofícios e para as agremiações escolares.

Nas instituições docentes ligadas aos grémios de comerciantes destacam-se a escola dos mercadores de Taylor, de Londres, e as de Hamburgo.

Independentemente das circunstâncias que deram origem às escolas monásticas, catedrais e capitulares, e à organização das Universidades, constituiu-se na baixa Idade Média o ensino particular e o das escolas municipais.

O ensino particular, raro na alta Idade Média, apresenta-se em correlação principal com o desenvolvimento da burguesia mercantil e da respetiva ilustração. Os mestres particulares não instruíam, por isso, em ordem à formação latina de letrados, consistindo a instrução, normalmente, no ensino elementar da leitura, da redação de documentos relacionados com a atividade mercantil, e da escrituração e contabilidade. Pela estrutura, foi um ensino livre, remunerado pelos alunos, laico, isto é, não dependente diretamente da autoridade eclesiástica, e de sentido prático.

As escolas municipais, ou comunais, criadas e mantidas pelos municípios, comunas, cidades livres ou burgos favorecidos com foros e franquias, surgem a partir do século XIV, principalmente na Itália do Norte, na Flandres, no território da Liga Hanseática e na Inglaterra. A sua constituição e desenvolvimento apresentam-se em correlação com as exigências crescentes da formação utilitária e profissional e com o aumento do número de mestres, devido à expansão do ensino particular.

Estas escolas tiveram como objetivo predominante o uso prático do latim, em ordem ao emprego oral e à redação de escritos utilitários, principalmente comerciais.

Regiam-nas normalmente um clérigo, sem embargo da evolução se haver operado no sentido da secularização do magistério. Os alunos repartiam-se, geralmente, em três grupos, consoante o respetivo adiantamento: tabulistas, donatistas e alexandristas.

Os «tabulistas» constituíam o grupo de principiantes que aprendiam a ler e a escrever. A designação provinha da aprendizagem se fazer com a tabula, isto é, um quadro (ou quadros) com o abecedário, os artigos de fé e as orações.

Os «donatistas», assim chamados por terem como texto principal a Arte de Donato, estudavam os rudimentos de gramática latina que este manual proporcionava, e exercitavam-se na leitura de alguns escritos, designadamente os Disticha Catonis.

Os «alexandrinistas» formavam o grupo mais adiantado, provindo a designação do Doctrinal, de Alexandre de Vila Dei, seu livro de estudo gramatical.

O passadio dos mestres nem sempre foi folgado. O pagamento dos honorários era feito frequentemente em espécie, e como os contratos se estabeleciam por períodos curtos, geralmente de um ano, a instabilidade obrigou-os muitas vezes à vida ambulante, levando consigo os próprios escolares (Scholastici vacantes), que não raro procuravam a subsistência sem grandes escrúpulos, pelos meios que se lhe ofereciam.


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