4. Anotações ao Tratado da Sphera

A descrição do conteúdo do Tratado da Sphera tem sido feita por vários bibliógrafos; a última em data, e, quiçá, a mais minuciosa, deve-se a D. Manuel II no citado vol. I dos Livros antigos portuguezes (1489-1600) da Biblioteca de Sua Majestade Fidelissima, pp. 543-544, assim redigida:

[fol. 1]  Privilegio Real de 27 de Septembro de 1537.

[fol. 2] AO SERENISSIMO E EXCELLENTISSIMO PRINCIPE HO IFANTE DOM ? LUYS [...]

[fol. 3]  Prohemio do autor [...] Capitulo primeiro [...]

[fol. 7]  Capitulo fegundo. Dos circulos dos quaes a efphera ? mateterial he campofta per que entendemos a celeftial. […]

[fol. 11] Capitulo. iij. De como nacem ? fe poem os fignos. Da? deferença dos dias ? noytes: ? da deferéça dos climas. [...]

[fol. 17 v] [...] Capitulo. iiij. Dos circulos ? mouimentos?dos Planetas: ? das califas dos eclipfes do ?  Sol ? da Lua. [...]

[fol. 23] [...] Fim do tratado da Sphera com ?  fuas anotações.

[fol. 23 v] THEORICA DO SOL E DA LVA TIRADA ?DE LATIM EM LINGOAGEM PER HO ?DOCTOR PERO NVNEZ. ? DO SOL. [...]

[fol. 26] [...] ACABA A THEORICA DO SOL. ? Theorica da Lua. [...] [fol. 30v] [...] FIM DA THEORICA DA LVA.

[fol. 31] Liuro primeiro da Geographia de Ptolomeu. ? Capitulo primeiro [...]

[fol. 48 v] [...] Fim do primeiro liuro. ? ANNOTACOES NESTE PRIMEYRO ? LIVRO DE PTOLOMEO. [...]

[fol. 51] Tratado que ho doutor Pero ? nunez fez sobre certas duuidas da nauegação: dirigido ?a el Rey nof fo fenhor. [...]

 [fol. 59] Tratado que ho doutor Pero ?nunez Cofmografo del Rey nof fo fenhor fez ? em detentora da carta de marcar: cõ o regi?meto da altura. Dirigido ao muyto ? e fcrarecido: ? muyto excelen?te Principe ho Iffante ? dom Luys. ?c...        

[fol. 90] Georgij coelij Epigramma. [...] Acaboufe de emprimir a pretente obra na muyto ? nobre ? leal cidade de Lixboa per Germão Ga-? lharde empremidor. Ao primeiro dia do 1 mes de Dezembro. De. 1537. annos.  

[fol. 90v] Erratas.

Folio; [90] folhas; 40 linhas; caracteres gothicos de dois tamanhos, sendo menores os das notas marginaes; sem titulos correntes nem reclamos; com figuras. 

Numeração dos cadernos: 2 folhas sem assignaturas; a-c, 8 folhas cada caderno; d, 4 folhas; aa-bb, 8 folhas cada caderno; cc, 4 folhas; A-D, 8 folhas cada caderno; E, 6 folhas; F, 2 folhas; total de 90 folhas           

A declaração da errata: “no terceiro capitulo da sphera na annotação.f. que esta na margem diz em algús liuros.80. segundos: e ha de dizer oyto”, hic, p. 242, 11. 4-6, inculca que houve correção da forma, mas este incidente da impressão em nada altera a descrição que acabamos de transcrever.        

Na presente edição do Tratado da Sphera respeitou-se o texto original, designadamente a diversidade da grafia das mesmas palavras, a falta de acentos, a irregularidade da pontuação, o emprego de v por u e j por i no começo das palavras, e o de u por v no meio. As emendas feitas vão expressamente referidas nestas anotações; as letras desdobradas são impressas em itálico e quando inserimos letras omitidas, indicamos a respetiva colocação entre [].      

A presente edição do Tratado da Sphera não reproduz em fac-símile os desenhos que ilustram e esclarecem o texto de 1537; grosseiros por vezes, e nem sempre de clara reprodução, foram desenhados de novo, expressamente, pelo Sr. Dr. F. Martins Vicente, professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra, com base nas gravuras do original e na respetiva aplicação.      

Nas notas seguintes não aludiremos à possível originalidade de Pedro Nunes na imaginação ou debuxo destes desenhos, porque este estudo só pode fazer-se mediante o confronto de todas as edições latinas das obras que ele traduziu. As atuais circunstâncias da Europa não nos permitem este trabalho, que adiaremos para melhor e mais pacífica oportunidade; entretanto, notaremos, como advertência, que as edições latinas do Spherae tractatus, de Sacrobosco, anteriores a 1537, que lográmos ver, exibem a maior parte dos desenhos que ilustram o texto da tradução de Pedro Nunes.      

ANOTAÇÃO AO PRIVILÉGIO REAL

DE 27 DE SETEMBRO DE 1537

(p. 2)    

Neste alvará cumpre notar:      

1.° A circunstância de ser dirigido a Pedro Nunes, e não a um impressor. Este facto parece inculcar que a edição do Tratado da Sphera pertenceu ao autor e não ao editor.               

2.° Os termos da autorização — poder “mãdar emprimir todas as obras que tem feytas: assi em Latim como em Lingoagem das sciencias Mathematicas e Cosmografia” — revelam:            

a) Que Pedro Nunes, em 1537, tinha “obras” em português e em latim sobre cosmografia e matemática. Com efeito:               

– Sobre cosmografia, o Tratado da Sphera prova o asserto pelo que respeita à língua portuguesa, assim como o De ortu et occasu signorum e o Astronomici introductorii de spxra epitome, ambos de data duvidosa, como adiante mostraremos, na parte referente à língua latina, se se admitir que são anteriores ao Tratado da Sphera;

— Sobre matemática, a esta data de 1537, pode asseverar-se com segurança que havia escrito um livro sobre a Geometria dos triangulos spheraes, cujo original se julga perdido. Prova-se com a referência da p. 68, 1. 18 (vol. I).

b) Que ficara isento de sujeitar os seus escritos à censura prévia.

Sob este ponto de vista, compare-se este alvará com o de 20 de Fevereiro de 1537, a favor de Baltazar Dias, o qual prescrevia que, se este “fizer algüas obras que toquem em cousa de nossa santa fee, nam se ymprimiram sem primeiro serem vistas e enjaminadas por mestre Pedro Margualho” (ver Venâncio Deslandes, Documentos para a Historia da Typographia Portugueza, Lisboa, 1888, p. 21).

A isenção tem a fácil explicação de Pedro Nunes, pela natureza da sua atividade científica, não tocar em matéria religiosa.

3.° A duração do privilégio pelo período de dez anos.

Esta duração, para casos semelhantes, havia já sido estabelecida anteriormente, pelo menos em relação ao músico da real câmara, Gonçalo de Baena, em 19 de Junho de 1536, para a sua Arte de tanger (ver Venâncio Deslandes, ob. cit., p. 20).

4.° A contravenção do privilégio seria punida com a apreensão dos volumes, e com a multa de 50 cruzados, a repartir em partes iguais pelo Hospital de Todos os Santos, e pelo denunciante da contravenção.

Estas duas penalidades também não eram novas, pois ocorrem no referido privilégio a favor de Gonçalo de Baena; porém, o destino da multa, não sendo novo, pois o encontramos estabelecido por D. Manuel no alvará a favor de Valentim Fernandes, de 22 de Fevereiro de 1503 (ver Venâncio Deslandes, ob. cit., p. 4) é, de certo modo, singular, pois no mesmo ano de 1537, em Fevereiro, D. João III havia estabelecido que uma das metades da multa recaísse em benefício dos cativos (Id., ibid., p. 21).

Este privilégio a favor de Pedro Nunes é de acrescentar à coletânea de Venâncio Deslandes.

ANOTAÇÕES À DEDICATÓRIA

“AO SERENISSIMO E EXCELENTISSIMO PRINCIPE

HO IFANTE DOM LVYS”

(pp. 3 e 4)


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