Segunda Parte - que compreende os anos que discorrem desde meados do de 1537 até fim do de 1540 (I)

«1.° É certo que Fabrício estava cá em 1535, pois neste ano, Clenardo, em carta datada de 3 de Outubro (a 2ª carta a Vaseu), falando da imprensa latina e grega do convento de S. Cruz, recomenda a Vaseu se entenda com Fabrício, 'que aí ensina grego".

«E que esta carta é incontestavelmente de 1535, conquanto não traga a designação expressa do ano, prova-se pelas duas razões seguintes:

«Na edição de Antuérpia, em que as cartas de Clenardo vem agrupadas segundo a ordem cronológica por que foram escritas ao mesmo destinatário, esta (que é de 3 de Outubro, mas só fechada um pouco mais tarde, em Novembro), vem depois doutras de 1535 e imediatamente antes duma de 3 de Janeiro de 1536.

«Há nela referência a um facto que desfaz as últimas dúvidas: Calendis Iunii patrem familias agere coepi emptis antea servis duobus care admodum. Ora este facto de ter montado casa com dois escravos, passou-se com certeza no ano de 1535, consoante se verifica pela Carta a Polites de 27 de Dezembro de 1536, em que diz: Institui aestate superiore familiam duobus emptis mancipiis, quibus nuper adieci tertium. "Aestate superiore" significa estio do último ano; se Clenardo quisesse dizer o estio do ano em que a carta foi escrita, diria antes aestate proxima, como na Carta a Hovério de 27 de Fevereiro de 1538.

«Em fins de 1533, quando Clenardo chegou a Portugal, — deve entender-se, como entendeu Leitão Ferreira, nas Notic. Chronol. da Univ., 1ª P., n.° 1165 o seguinte passo da carta já citada de Clenardo a Vaseu, em que diz enviar-lhe a carta que o Fabrício lhe escrevera: Hunc Vicentium ut noris, mitto ad te epistolam quam ad me principio adventus dederat: ei cum respondissem, de homine postea nihil accepi, forte quod inurbanius rescripsissem et rusticius.

«Quam ad me principio adventus dederat, traduziu Leitão Ferreira como significado que "Fabrício lhe escreveo logo que elle Clenardo chegara a Portugal": portanto, em fins de 33.

«Ou pelo menos de 1534. — É que, talvez com melhor inteligência do latim, se deva antes traduzir principio adventus por uma data litúrgica, como Clenardo muitas vezes usa na sua correspondência, significando, portanto: no começo do Advento. Isto levar-nos-ia a fixar a data do começo do Advento de 1534, como data certa da estada de Fabrício em Portugal. Porquanto sendo esta carta escrita a 3 de outubro de 1535 (como acima disse) e caindo neste ano o primeiro domingo do Advento a que se refere Clenardo como sendo aquele em que Fabrício lhe escrevera, só pode ser o Advento do ano anterior (ainda não houvera outro, ao tempo em que Clenardo escrevia), isto é, o Advento de 1534.

«Viveu largos anos Fabrício em Portugal, não podendo ter-se o ano de 47 como o do termo dos seus trabalhos, como parece indicar o Sr. F. de Almeida. A última referência a ele que encontrei nos livros do Arquivo da Universidade tem a data de 28 de Setembro de 1560 e ensina-nos que, «não podendo ler M. Fabrício», lesse por ele o substituto Pero da Cunha.»

b) Sobre a heterodoxia de V Fabrício. O Dr. António Baião, no seu documentado estudo — A Inquisição em Portugal e no Brazil, em Archivo Historico Portuguez, vol. VI, Lisboa, 1908, p. 474, deu notícia da seguinte denúncia:

«No dia 4 de maio (1551) compareceu o licenciado Jorge de Sá, medico, natural de Coimbra, que denunciou Mestre Fabrício lente de grego na Universidade de Coimbra porque quando ia ouvir missa levava os Diálogos de Luciano, apostata, segundo o denunciante ouvio a D. Basilio conego de S.ta Cruz e ao Dr. Antonio Correia, irmão do denunciante. Mestre Fabrício comia carne ás 6.as feiras e mais dias defesos, assim como um livreiro de Coimbra, Henrique de Colonia. Também d'uma vez impedira de rezar um criado. (Nota á margem, da mesma letra das anteriores, que parece do Promotor: Parece caso pera prover).»

O Dr. Mário Brandão, aludindo a este documento, informa no vol. I,p. 164, do cit. O Colégio das Artes, que o delator, o licenciado Jorge de Sá, «que já se distinguira no ódio a João da Costa, a quem buscara ferir de morte» fora «célebre médico conimbricense de quem um admirador escreveu: aquelle grande fizico o melhor do mundo, e mais tarde, sendo lente de Véspera de Medicina, dava as boas vindas em nome da cidade, num discurso empolado, ao infeliz D. Sebastião».       

c) A Provisão de 11 de Março de 1551, referida neste parágrafo, foi publicada pelo Dr. Mário Brandão, em O Colégio das Artes, I, p. 465; e nos seus Alguns documentos..., cit., encontram-se várias cartas de   V. Fabrício, do mais alto interesse.

[LVI]                                                                                                                                                   (§ 361)

O alvará de 13 de Outubro de 1539, nomeando Bartolomeu Felipe lente de uma cadeira pequena de Cânones, foi publicado pelo Dr. M. Brandão no vol. I, p. 215, dos Documentos de D. João III.   

Cumpre notar que no dia anterior, em carta de 12 de Outubro, D. João III anunciava ao reitor da Universidade a constituição do quadro docente da Faculdade de Cânones, no qual se contava B. Filipe, e no Regimento de Cânones, de 13 de Outubro, o seu nome aparece igualmente, fixando-lhe a obrigação de uma lição diária, das 2 às 3 da tarde, no inverno, e das    

3 às 4, no verão (ob. cit., pp. 207 e 211).

O alvará de 7 de Setembro de 1542 pode ler-se no vol. II, p. 97, da mesma obra, a qual se encontra ao presente no prelo.               

[ LVII ]                                                                                                                                                   (§ 370)

SOBRE SEBASTIÃO BERNARDES, LENTE DE INSTITUTA

Leitão Ferreira, baseado em Carneiro de Figueiroa (vid. Alphabeto dos Lentes, p. 144), não hesitou em afirmar que Sebastião Bernardes fora lente de Instituta em 1538. Afigura-se-nos errónea esta afirmação, como se depreende dos seguintes factos:

Em 17 de Setembro de 1539 assinava D. João III o Regimento da Instituta, no qual, além das novas prescrições pedagógicas, fixava o respetivo quadro docente. Sebastião Bernardes foi um dos lentes nomeados, determinando o Regimento que leria à tarde, do princípio do estudo, isto é, de 1 de Outubro, à Páscoa, das 2 às 3, e da Páscoa até ao fim do ano, das 3 às 4 (vid. Mário Brandão, Documentos..., cit., p. 188). Ignoramos se Sebastião Bernardes tomou ou não posse; o facto é que, decórrido um mês, em 27 de Outubro de 1539, D. João III nomeava o bacharel Rui Gonçalves para ler a «lição da Instituta q o bacharel bastiã bernaldez por meu Rygim.to ouuera de ler as oras no dito Regimento declarada» (vid. M. Brandão, Documentos..., cit., p. 217), — o que claramente mostra que Sebastião Bernardes não regeu a cátedra no início do ano letivo, para que havia sido nomeado.


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Vamos corrigir esse problema